Abra a cabeça!!!!!!!!

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"Se a única ferramenta que temos é um martelo, todo problema será reduzido a prego"

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

SEXTO E SÉTIMO ANO: Futebol e Cultura da Paz - "Jogando para a Paz"

PLANO DE AULA: Futebol e Cultura da Paz - "Jogando para a Paz"

Educando para a Paz

Nei Alberto Salles Filho
Professor do Curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Estadual de Ponta Grossa - Paraná.
Especialista em Pedagogia do Esporte.
Mestre em Educação.


nei.alberto@uol.com.br

Terceiro ciclo do Ensino Fundamental - 5ª e 6ª séries

Quatro aulas

O futebol, tomado como manifestação cultural, tem dimensões positivas ligadas ao espetáculo, à motivação e à alegria das pessoas. Por outro lado, traz também a violência, parte integrante dos noticiários esportivos, tanto em campo, entre os jogadores, quanto na arquibancada, entre os torcedores.
Com a seqüência de aulas aqui proposta pretendemos "olhar" esse futebol, procurando enxergar uma estrutura alternativa, ligada à criação de uma cultura da paz no esporte praticado na escola, nas aulas de Educação Física. Para tal, propomos a utilização de documentos em vídeo e reportagens de jornal ou revista e, numa segunda etapa, a organização de um torneio de futebol na escola.
Entendendo cultura como a forma do homem viver em sociedade, incluindo tudo o que ele pensa e faz com seus valores e características próprias, torna-se possível pensar na cultura da paz, fundada na ética, que no espaço escolar deve trazer atitudes críticas, de reconhecimento de limites e de possibilidades, de novas ações e valores que permitam escolhas e caminhos baseados em ações coletivas e solidárias. Seguiremos para isso os princípios de Drew (1990): cooperação, calma, determinação para discutir diferenças, capacidade para agir num clima de cooperação para solução de problemas, amor e concordância e a capacidade de dizer "Eu sou humano. Cometi um erro. Vou tentar novamente".

Ao final da proposta, espera-se que os alunos estejam aptos a:
- entender a dimensão do futebol como cultura;
- valorizar os aspectos positivos do futebol;
- repudiar a violência que acontece entre jogadores e torcedores de futebol;
- propor novas formas de relações dentro do jogo e da torcida;
- praticar o futebol de acordo com regras discutidas coletivamente;
- usufruir do futebol como prática saudável e solidária.

Fitas de vídeo, reportagens de jornal ou revista e quadro-negro. Algumas considerações importantes: fitas de vídeo como "Isto é Pelé", sobre a vida de nosso grande craque ou "Todos os corações do mundo" (ambas disponíveis em locadoras de vídeo), que tratam do grande espetáculo que é o futebol, são indicadas para incentivar as aulas.
Porém, fatos do cotidiano, na maioria das vezes, são mais próximos dos alunos. Assim, nada pode ser mais rico que aproveitar o acontecimento do final de semana, como um grande clássico, os gols, a paz ou o confronto entre torcedores, a festa e a alegria. Procure levar essas informações para as aulas. Você já percebeu quantos canais (sejam abertos ou fechados) apresentam programas de futebol no domingo à noite? E ainda, quantas reportagens interessantes em época de Copa do Mundo? O esporte, e conseqüentemente o futebol, ocupam espaços de destaque na mídia. Sendo assim, as melhores fitas de vídeo serão aqueles minutos gravados por você, com os gols da rodada ou a entrevista com jogadores ou, ainda, as reportagens esportivas dos cadernos de esporte do jornal de domingo.

O espaço deve ser sempre organizado para proporcionar melhor aprendizagem e relações humanas mais qualitativas. Quadra, sala de aula e pátio podem igualmente ser usados, dependendo dos objetivos propostos. Porém, algumas dicas são pertinentes: seja qual for o espaço, é importante iniciar e encerrar a aula com a idéia da roda. A roda (círculo, ou assembléia) é efetivamente o momento onde o grupo fica à vontade para expressar suas impressões. Ela pode e deve ocorrer em espaços diferenciados. Os momentos de trabalho coletivo podem ser organizados em pequenos grupos (cinco a sete alunos), que ao longo das aulas serão reunidos mais de uma vez. A quadra ou o pátio onde a prática do futebol ocorrerá devem ser também entendidos como "sala de aula aberta" e, da mesma forma, organizados pelo professor. Uma pequena lousa móvel pode ser levada para a quadra ou o pátio.
É importante destacar que as aulas de Educação Física são muito identificadas com espaços abertos. Por essa razão, levar um recurso didático (nesse caso a lousa) faz da quadra, além do lugar mais apropriado, o local onde o conhecimento pode ser tratado de forma gostosa, sentado no chão, em círculos.
Nos jogos de futebol, durante o torneio, o local para a torcida e demais integrantes deve ser definido anteriormente para evitar confusões. Leve em conta os espaços disponíveis ao redor; a proximidade com salas de aula (para não atrapalhar o trabalho de outros professores) e que todos os espaços possíveis próximos ao jogo estejam ocupados de forma homogênea, para gerar um clima apropriado. É importante lembrar que, assim como em todo o processo, os alunos devem participar da definição dos locais. O exercício de respeito ao espaço de cada um e de todos começa por aqui.

1ª Aula

Objetivo: compreender aspectos sociais e culturais ligados à paixão e à violência no futebol.
Partindo da apresentação de uma fita de vídeo (observe as dicas em material didático) mostre duas questões básicas:
1. A arte e a cultura do futebol: os gestos técnicos, a habilidade dos craques, a beleza da torcida empolgada.
2. Imagens de conflitos entre torcidas e lances violentos do jogo.
Depois de levantar esses dois extremos, organize os alunos em grupos de cinco a sete participantes. Cada grupo receberá uma cartolina. O exercício será discutir o tema nos grupos.
Os alunos devem listar, na cartolina, as coisas mais marcantes que viram na fita, tanto nos aspectos positivos quanto negativos. Depois disso, os grupos farão uma exposição de suas idéias. À medida que os grupos se apresentam, escreva no quadro os itens levantados. Ao término, reafirme a dimensão cultural do futebol no Brasil, ressaltando sua ligação com a violência que, na maioria das vezes, é diretamente relacionada à falta de respeito ao espaço e às idéias dos outros. O fato de as pessoas torcerem por times diferentes não é motivo para que se agridam. O mesmo princípio vale para religiões, partidos políticos, agremiações. Nesse momento é importante você destacar que a não-violência começa justamente quando compreendemos e aceitamos as diferenças do modo de ser e de pensar de cada um. De maneira ética, podemos discordar, argumentar a favor de nossas idéias e expor nossas opiniões. Assim, o futebol deve ser pensado como algo a ser aproveitado com prazer e alegria, pelo jogo, pela confraternização e não como confronto, como guerra.

2ª. Aula

Objetivo: criar um torneio de futebol entre os alunos da turma. A partir do que foi levantado na aula anterior sobre a arte do futebol e a violência que muitas vezes toma conta do esporte, alunos e alunas da mesma série, com a sua ajuda, devem estabelecer regras de jogo e algumas normas de comportamento da torcida, para que não haja violência dentro e fora de campo.
No início, em roda, na quadra ou no pátio, retome os conceitos trabalhados na aula anterior. Em seguida, fale sobre a importância do aquecimento na preparação para a prática de esportes - e promova um específico para futebol. Faça uma divisão aleatória do grupo deixando que joguem livremente durante alguns minutos. Naturalmente, o modelo cultural vigente acaba se reproduzindo. Haverá uma certa violência, individualismo e desrespeito ao outro.
Rapidamente, após alguns minutos nesse modelo tradicional, solicite a volta à roda para discutir sobre os contratempos observados. Faça-os perceber como a violência e a falta de respeito atrapalham o desenvolvimento positivo do jogo. Em seguida, solicite a reorganização da classe nos grupos da aula anterior, na própria quadra, e distribua as cartolinas da primeira aula. No verso, peça aos alunos que respondam a seguinte questão: "De que forma é possível superar os conflitos observados na prática para um futebol com maior integração e paz?" Nesse momento, comporte-se como mediador, procurando incentivar os alunos a pensar um caminho para a prática do futebol de forma mais cooperativa e não violenta. A aula termina em roda, socializando os aspectos levantados e fazendo propostas de como organizar o torneio.

3ª. Aula

Objetivo: organizar a proposta do "Jogando para a Paz".
Retome o que ficou definido na aula anterior sobre o campeonato. Agora o desafio é organizar o torneio, que poderá ser chamado "Jogando para a Paz" ou "Paz em Campo" ou "Paz no Futebol" ou um nome definido em votação pelo grupo. A idéia é trabalhar com alguns critérios (definidos a partir das aulas anteriores).
Como exemplos: equipes mistas para maior compreensão da questão de gênero; regras adaptadas do futebol favorecendo interações mais produtivas, como faltas violentas e agressivas (chutes, carrinhos, insultos) que podem ser revertidas em pontos para a outra equipe.
Isso mostra que para vencer a partida é necessário e fundamental respeitar o outro. À medida que as regras são definidas, mostre aos alunos como se faz um torneio em rodízio simples: todas as equipes jogam entre si. Esse modelo favorece o conhecimento e a interação entre os participantes, o que faz dele uma das formas mais democráticas de competição.
Assim, ao final da aula, todos os alunos têm clareza das regras e da constituição das equipes (por sorteio ou definidas por um ranking bem equilibrado). Ressalte ainda que todos os "papéis" do torneio estarão definidos: técnicos, arbitragem e auxiliares, proporcionando que todos participem do "Jogando para a Paz". Outro aspecto fundamental que cabe destacar aos alunos é a importância da torcida para o torneio. Como foi visto nas aulas anteriores, é muitas vezes a torcida, ou membros dela, que acabam gerando violência nas partidas. O papel da torcida é importante como incentivo às equipes (palavras de apoio e motivação) e, portanto, qualquer comportamento que desvirtue esse objetivo também tem prevista a concessão de um benefício à equipe de direito, como a marcação de pontos ou cobranças de falta.

4ª. Aula

Objetivo: praticar o futebol, atento às regras estabelecidas com o grupo.
Em círculo com os alunos, retome rapidamente as regras gerais estabelecidas. É importante compreender que as regras foram estabelecidas coletivamente. Vale o lembrete que o entendimento de "regra" aqui passa por normas que são estabelecidas em conjunto e que proporcionam bem-estar individual e do grupo! Vamos a algumas delas:
Em relação à torcida: agressão de qualquer forma (física ou moral) será revertida em faltas ou pontos para a outra equipe (deixe que os alunos decidam).
Da mesma forma, conceder pontos para as torcidas que incentivarem mais sua equipe. Ainda mais: por que devem coexistir torcidas se confrontando? Se for possível (dependendo da maturidade e do entendimento do grupo sobre as aulas anteriores), propor que haja uma torcida única, incentivando as duas equipes, os lances bonitos de ambos os times e ao mesmo tempo repudiando qualquer forma de violência.
Em relação ao jogo: a organização de equipes mistas pode ser um recurso valioso, se bem organizado, uma vez que se procura valorizar a integração. O ideal é que o número de meninos e de meninas seja o mesmo em cada equipe na quadra. É necessária também a atenção com jogadas violentas e o desrespeito com outros jogadores. Nesses momentos o infrator deverá desculpar-se com o outro e, conforme a gravidade, substituído temporariamente para perceber que atitudes violentas acabam sempre por atrapalhar a convivência pacífica e harmoniosa (é importante que você esteja atento para isso, para que a substituição não ocorra apenas como punição pela violência, mas, sim, um momento de reflexão sobre as atitudes em sociedade. Em relação à forma de desenvolvimento do torneio: vale lembrar que um dos mecanismos utilizados nas aulas de Educação Física, durante muitos anos, foi a lógica do "quem perde sai" ou "quem leva gol sai". Assim, na maioria da vezes, a equipe "mais forte" ficava a aula toda jogando, enquanto os "outros" revezavam poucos minutos, ou segundos, caso levassem o gol. Esse procedimento valorizava os "mais aptos" em detrimento dos "ruins". Esse fato contribui muito para a exclusão de muitas pessoas do mundo da cultura corporal, seja por vergonha ou por achar que "não sabiam jogar". Lembramos que isso acaba fazendo com que o lado bom e positivo da prática esportiva acaba sendo esquecido. Muitas vezes essas crianças frustradas acabam sendo torcedores que vêem na vitória de sua equipe a grande razão para sua própria vitória, a qualquer custo. O aspecto primordial no torneio é que todas as equipes joguem praticamente o mesmo número de partidas e com a mesma duração. Aqui, cada criança já tem seu direito garantido de participar em igualdade, de usufruir do seu tempo com sua equipe e com os colegas, sem a pressão de já ter que sair. Ressalta-se que, com esse procedimento, cada grupo pode melhorar suas ações, tanto de socialização quanto técnicas, a cada partida. Cabe lembrar que o objetivo é melhorar as relações humanas durante a prática do esporte e não necessariamente descobrir grandes talentos esportivos.
Em seguida, prepare o início do torneio fazendo o sorteio da seqüência dos jogos, que nesse dia terão um caráter mais experimental, como um "torneio início", em que novas regras poderão ser testadas. Assim, junto com os alunos auxiliares de arbitragem, a cada infração cometida, pare para explicar e relembrar as regras que foram acordadas. Ao final da aula, em "roda", são discutidas as regras, dificuldades, melhoria do jogo e a importância de buscar a confraternização. Dessa forma, a partir das aulas seguintes, você e a turma poderão dar continuidade ao torneio, agora sim, exercitando essa forma de cultura da paz. Com esse jogo mais elaborado, você terá maior facilidade para inserir aspectos técnicos e táticos do futebol nas aulas, uma vez que estará assegurada a prática de forma sadia, que conduz ao objetivo final da Educação Física: a prática corporal utilizada no tempo de lazer e para melhoria da qualidade de vida.

Avaliar é realizar uma apreciação qualitativa sobre aspectos relevantes do processo desenvolvido. Assim, a pergunta é: Quais os aspectos relevantes do processo desenvolvido? Tomamos como fundamentais a aquisição de conceitos ligados à paz no futebol. Dessa maneira, o relato dos alunos (individuais e em grupo) bem como a própria participação nas aulas, de acordo com os critérios definidos coletivamente, farão com que se processe e se concretize a avaliação, que poderá ser instrumentalizada por fichas, relatos escritos, verbalização, entre outros.

Estamos no ano de Copa do Mundo. É um ótimo momento para aprofundar conceitos e conhecimentos dos alunos sobre esse fenômeno cultural que é o futebol. Assim, pensar em uma cultura da paz para o futebol, organizando um torneio com a própria "cara" da turma, contribui para a criação de uma identidade cultural própria do futebol para as crianças.

A "Ética" como Tema Transversal dos PCN´s pode ser tratada com profundidade nesta proposta. Além disso, algumas ligações poderão ser criadas particularmente com História e Geografia, no que se refere à história do futebol e países participantes da Copa do Mundo.

O processo denominado "Jogando para a Paz" procura estabelecer novos indicadores ligados a relações interpessoais, a percepção, a análise, a crítica e síntese da cultura do futebol e, finalmente, a uma prática com novos elementos e configurações. Para que efetivamente a proposta aconteça, você deve, de fato, acreditar na urgência do tema, que pressupõe não aceitar como "normal" ou "inerente ao esporte" a violência e o desrespeito ao outro e à vida. Estabelecer uma cultura da paz no futebol deve ser o ponto de partida.

DREW, Naomi. A paz também se aprende. São Paulo: Gaia, 1990.
MARTINELI, Marilu. Aulas de transformação: o programa de educação em valores humanos. São Paulo: Peirópolis, 1996.
A escola de chuteiras. Revista Nova Escola. nº 151, Abril de 2002.
Parâmetros Curriculares Nacionais: fáceis de aprender (5ª à 8ª séries). Revista Nova Escola, Edição Especial, 2000.
WEIL, Pierre. A mudança de sentido e o sentido da mudança. Rio de janeiro: Record: Rosa dos Tempos, 2001
Sites:
www.unipaz.org.br
www.valoreshumanos.org.br
www.cev.org.br
www.fundacaopeiropolis.org.br
www.nossogrupo.com.br/grupo.asp?10660
www.uepg.br/neppef

Um comentário:

Nei Alberto disse...

Olá, parabéns pela iniciativa do blog.
Fico feliz em meu trabalho contribuir com todos!!!!
Estou à disposição.
Prof. Nei Alberto